Há exatamente um mês comecei a escrever este diário, neste mesmo lugar, sentada no chão, com o laptop diante de mim, sobre uma cadeirinha azul de criança. Não vou dizer que parece que foi ontem porque é um chavão usado e batido. Mas que parece, parece.
Acho que em todos meus diários eu sempre comento como o tempo psicológico é esquisito durante viagens, especialmente as intensas (ah, bem, e tem outro tipo de viagem? Ao menos que valham a pena, não). Parece que cheguei ontem, mas também parece que estou há meses aqui. Aliás, parece que estou há dois anos aqui, porque cada nova viagem, dormindo na mesma cama, andando pelas mesmas ruas, reencontrando as faces de antes, é simplesmente a continuação de uma única permanência aqui. É como se não tivesse nunca ido embora.
E dentro de mim toma forma um Canadá mítico, próprio, pessoal e intransferível.
Meu Canadá é curiosamente desprovido de invernos e de neve. É uma eterna meia-estação de temperaturas amenas. Meu Canadá é um enclave lusófono num contexto anglo-falante. Meu Canadá é uma longa busca e um recorrente re-encontro com minha brasilidade, um lugar onde constante e inconscientemente eu e outros como eu procuramos os iguais – e “igual” passa a ser determinado apenas pela língua original, sem importar o acento. Eu poderia discorrer on and on and on sobre isso, mas acho que vocês já entenderam meu ponto. Se não paro por aqui, vou começar a soar perigosamente semelhante a certo autor famosinho que decididamente abomino.
(Nota que deveria ser de rodapé: dado meu iminente retorno à pátria, com todas as dores e alegrias inerentes, deixo hoje de lado minha obsessão em evitar advérbios terminados em -mente, bem como outros termos terminados em -ente. Yay! Sinto-me incrivelmente livre!)
Voltando ao minucioso relato do dia-a-dia de uma viajante-escritora compulsiva, ontem foi um dia de puro marasmo. Perdido já no labirinto entre os dois hemisférios do mundo, meu cérebro simplesmente se recusou a fazer qualquer coisa original, arrojada ou surpreendente.
Um evento delicioso a marcar este final de viagem foi ter conhecido, após dezenas de scraps, e-mails e telefonemas, a Danny e o Neil e a filhinha deles, a Yasmin. Passeamos pelo St. Lawrence Market e fomos a um restaurante (Town & Country Market Fresh Buffet, 190 Queens Quay East). Ok, a comida não era lá essas coisas, exceto pelas sobremesas, mas o lugar é uma delícia! Eu voltaria lá pelo ambiente.
De tarde bateu uma preguiça total, e eu dormi. Acho que foi o cansaço acumulado de toda a viagem que me pegou. Ou quem sabe o consumo excessivo de açúcar. Talvez aquelas borboletas de que falei ontem. Um momento de “fechado para balanço”, maybe... Quem sabe o fato de ter fechado as malas (sim, coube tudo! Bem, praticamente tudo) refletiu-se em meu cérebro.
No meio de tudo, desisti de esperar pelo ep 12 de Blood Ties no IslifeCorp e assisti no YouTube mesmo. Hum. A lot of kissing around. I liked it. Very. Much.
Hoje o domingo amanheceu cinzento, taciturno, lento. Outside, inside.
Este é o último post da viagem. Talvez coloque um adendo, quando chegar ao Brasil, mas sei por experiência própria que posso demorar semanas para isso. Ou jamais fazê-lo.
Por isso... Tchau a todos! Acabou. C’est fini.
Mas não vou terminar com uma despedida, porque é deprê demais. E, afinal de contas, em outro momento esta viagem vai continuar. Pode ser daqui seis meses, pode ser um ano. Mas será a mesma viagem.
Algumas noites atrás vi algo que esqueci de comentar. Estava no metrô quando entraram duas moças. Uma delas, de costas para mim tinha uma bolsa ao ombro. A alça era uma corrente, presa à bolsa por uma algema. Uau. Percebi um rapaz olhando fixamente para a algema. A expressão do rosto dele mostrava tudo o que passava por sua cabeça. Com certeza o que havia passado pela minha e muito mais. Definitivamente, naquele momento eu desejei ter uma bolsa daquela. Se alguém aí souber onde tem, me avisa?
beijos e queijos e hasta la vista!
Martha Argel
domingo, 27 de maio de 2007
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