sexta-feira, 25 de maio de 2007

25 de maio, sexta-feira

Nossa, já está no fim! Embarco de volta depois de amanhã, nem acredito. Onde foi parar este último mês?!
Estou totalmente dividida. Should I stay or should I go? Devo ir, mas queria ficar. Por outro lado, estou ansiosa para voltar a minha casa, minhas coisas, minha cidade. Sensação peculiar essa, de se sentir em casa em vários lugares diferentes, mas já escrevi longamente sobre isso algumas semanas atrás.
Nestes derradeiros dias, acho que estou tentando fazer um apanhado sensorial da cidade, recolher na mente os últimos instantâneos. Os ângulos da luz, o movimento das pessoas nas calçadas. As fileiras de sobrados pitorescos nas ruas de árvores imensas. A ordem pacífica e desconcertante das avenidas movimentadas do centro. A desordem caótica e a falta de educação dos pedestres em Chinatown. Os parques, praças e esquilos. As gaivotas no céu. A familiaridade das estações de metrô. Os mil e um idiomas captados enquanto caminho na multidão.
Sempre é estranho voltar ao Brasil e perceber que todos falam a mesma língua que eu. Vocês têm idéia do privilégio que é poder se comunicar com todos ao nosso redor? Depois de alguma longa viagem ao exterior, cada conversa que tenho com gente na rua, com a caixa do supermercado, com o cobrador do ônibus, com quem for, é um momento precioso, que saboreio na ponta da língua. Estamos falando Português. Temos um idioma em comum. Falamos a NOSSA língua. Por algum motivo isso me enche de orgulho. Queria que todos sentissem isso. É tão bom. A gente se sente muito mais brasileiro quando sai do país.
O dia de ontem foi dedicado a uma missão quase impossível: fazer minha prima comprar um sutiã de verdade. Ela é uma das pessoas mais desencanadas do mundo para se vestir, e consegue usar as maiores camisetas e as calças mais amplas do mundo. “É confortável”. Sei. Já fui assim. E usa praticamente qualquer coisa, desde que seja... verde-limão! (Não posso falar muito; montei um guarda-roupa quase completo, só em tons de roxo, lilás, malva e fúcsia, mas pelo menos são do tamanho certo). Pois bem, agora que ela está procurando trabalho, tem que ficar mais apresentável. E decididamente, uma roupa de baixo adequada faz alguns milagres (rá, aprendi com a Trinny e a Susanna, em What Not To Wear). Comecei a buzinar no ouvido dela sobre sutiãs quando cheguei aqui, e ela me xingou por semanas. Assim, quase caí de costas quando ela me pediu pra ajudá-la a comprar a bendita pecinha de roupa. Urra!
Eu sabia que seria quase um milagre fazer a Clau entrar numa loja de lingerie, e que ela enrolaria até que eu desistisse de nossa missão, mas respirei fundo e ataquei o desafio.
A batalha começou ao meio-dia, quando a encontrei perto da Bloor, uma das principais ruas comerciais da cidade, senão a principal. Primeiro fomos a uma cantina italiana almoçar. Delícia! Comi um peixe cujo nome não entendi, mas estava maravilhoso.
Então entramos no Honest Ed’s, uma loja tipo Americanas, mas só com produtos de segunda, extremamente baratos. Saca Brás? Então. Com certeza não era ali que acharíamos o tal sutiã. Mas encontramos algo espantoso: uma prateleira de bustos do Elvis em tamanho natural, topete e tudo! Um pesadelo, em especial o que era colorido.
Próxima parada, uma loja de material de desenho e pintura. Namoramos canetas e cadernetas de anotações, cada uma mais linda que a outra. Comprei uma caneta roxa.
Em seguida, entramos num sebo. Inevitável. Mais uma vez me perguntei se de fato tenho algum sentido extra para encontrar livros de vampiros. No meio de centenas de livros, havia um, no chão, lombada pra cima toda empoeirada, e não dava pra ver nada a não ser que era preto. Aliás, a única lombada empoeirada ali. Fui direto nele. Bingo. Era um livro que eu nunca tinha encontrado, de Nancy Baker, escritora canadense excelente. Acabei comprando seis, a maioria em minha wish list há tempos. Yeah!
A seguir outro sebo. Um supermercado. Lojas de bugigangas. O tempo passando e nenhuma menção a sutiãs. Caminhando, caminhando, chegamos a Chinatown, e eu já perdia as esperanças. A Clau só falava em encontrar uns clogs, um tipo de tamanco de borracha super-ultra leve, que todo mundo usa por aqui, ela queria verde-limão (argh!). Eu lembrava de ter visto os malditos em Kensington Market. “Vamos entrar nessa rua que acho que vi aqui”. Busca infrutífera, mas achei algo que eu buscava, uma camiseta branca comprida e justa, também na moda aqui, por baixo de um top curtinho (é como a Vicki se veste em Blood Ties!). Olhando dentro da loja... AHÁ!!!!! Sutiãs!!!!
Agarrei a Clau pelo braço “Agora você entra aqui!” e puxei-a pra dentro. Como ia fazer pra garantir a ajuda da vendedora? E como convencer a Clau a experimentar um sutiã que fosse?! Aquilo ia ser um pesadelo! “Ai, tô tão cansada...”, e a Clau desabou num banquinho. Pelo menos não tinha saído correndo, primeira batalha vencida. Eu já ia na direção da vendedora, pensando em como recrutá-la para a luta, quando ela vem com um sorriso enorme. “Vocês falam português! Vocês são brasileiras?” Quase desmaiei de susto! Aquilo não era uma vendedora, era um anjo enviado pelos céus!
Resumindo: a Juliana era paulista, simpática e eficiente. Sabia tudo de sutiãs e conseguiu a façanha de fazer a Clau provar uns quantos (“O quê, eu tenho que experimentar antes de comprar?!”). Quando eu dei meu palpite que aquele menos confortável ficava melhor, ela foi genial: “Mas é melhor ela levar o que achou mais confortável, nessa fase de transição”. Além de anjo, instrutora. Cool! No fim, a Clau levou dois (yes! incluindo o “menos confortável”) e eu levei um, além das camisetas.
Vitória!!!!!
Pra completar, a Clau achou os tais clogs verde-limão.
Quando chegamos em casa, ela estava radiante. “Não são lindos?!” Não era dos sutiãs que ela falava. Esses foram pra gaveta. Os clogs ela colocou nos pés e não deve ter tirado nem pra dormir.

beijos a todos!
Martha Argel

PS. mais uma do sistema de transporte coletivo: na verdade, não voltei com minha prima. Ela veio de metrô e eu vim andando (deve dar uns 4-5 quilômetros da Bloor até em casa, quase uma hora de caminhada), mas cheguei poucos minutos antes dela! Por causa de um acidente na linha, o trem parou e lá ficou. Que saco, não?! Pelo menos dessa eu escapei.
PPS. pra quem quer ver a cara dos tais clogs, tem uma foto aqui: http://www.flickr.com/photos/anniemole/230486812/ . Enjoy.
PPPS. na caminhada de volta, sentei no Queen’s Park e fiquei um tempo apreciando as árvores e as pessoas fazendo o mesmo que eu. Lindo.

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