quinta-feira, 7 de novembro de 2002


Eu gosto de trabalhar. E quando o trabalho é bom, gosto ainda mais. É bom fazer o que a gente gosta. Anteontem, senti no rosto a chegada da frente fria, vento e chuva no alto de uma montanha. Ok, geomorfólogos puristas, não tentem acabar com minha ilusão, argumentando que não há montanhas em São Paulo, apenas morros. Acabem com minha ilusão de paz, minha ilusão de um dia encontrar o amor, mas não com a ilusão das montanhas. Eu até deixo vocês chamarem as aves de 'passarinhos', e as serpentes de 'cobras', mas permitam que eu continue com minhas montanhas!

Ontem, minha pequena travessura foi comer um frutinho que há semanas me tenta. Um arbusto espinhento, num jardim abandonado. Uma solanácea. As solanáceas são terrivelmente perigosas. Há solanáceas na mesa nossa de cada dia, como o tomate e a berinjela, mas há solanáceas cheinhas de alcalóides que te fodem de verde e amarelo. Venenos foderosos. Se tem um coisa que biólogo de campo aprende é: aprenda a reconhecer uma solanácea, e NUNCA coma seus frutos (isso pode salvar sua vida se vc se perder no mato). Então essa solanácea espinhuda me olhava, sedutora, há uns dois meses. Ontem foi o dia. Fruto dourado da chuva. Doce como açúcar, mas lembrando o tomate. Estou viva até agora.

E hoje: passei pela planta mas não comi o fruto maduro que acenava para mim. Amanhã eu como. Quase chegando em casa, vejo um cachorro com cara de perdido. Um poodle, chamei, me ignorou, tropeçou numa raiz. Velhinho. Cego. Dobrou a esquina e foi em direção à avenida. Uma suspeita e corri como uma doida. A quadra e meia de minha casa uma mulher, já velhinha, tem um poodle cego. O portão estava aberto. Bingo. Enquanto eu hesitava, a mulher apareceu na janela, e ficou ensandecida com a notícia que lhe dei. Saí correndo por um lado e pedi para ela cercar por outro. Na avenida, nada, continuei correndo, ninguém tinha visto, mas porra, o cachorro tinha vindo pra cá. Até que os sindicalistas que estavam fazendo uma manifestação na frente de uma fábrica gritaram ''o cachorrinho branco? atravessou a avenida!'' Voltei pra trás, até a avenida, e não acreditei: o bichinho estava do outro lado, sentadinho, com cara de que que eu faço agora. Atravessei voando, o semáforo ajudou, e me vi cara a cara com um cão que não me conhecia. Que que eu faço??? Dando adeus à bela pele de minhas mãos, agarrei o bicho com força, e ele, claro, ferrou os dentes em mim. A sorte é que ele é velhinho, e quase banguela!!! Ficaram só duas marquinhas. Depois, a velhinha abraçou o bichinho como se fosse o maior tesouro da vida. Provavelmente é. Provavelmente ele lhe dá mais carinho do que os filhos dela.

Pra terminar: em vez de ficar reclamando de que nunca acontecem coisas interessantes na sua vida, faça as coisas acontecerem, ok? Não tem festa pra ir? Pois então dê uma festa, porra!.

Parece que o dia vai ser de sol. Aproveitem as cores e a luz!
tita

Nenhum comentário: