sábado, 5 de julho de 2003

Oi, todos.

Parte del aire
Ás vezes me sinto estrangeira em meu próprio país, exilada de um país que não é exatamente meu e onde nunca morei, mas onde vive a maior parte de minha família e que amo com a ingenuidade dos infinitos verões infantis que lá passei, noutras décadas, noutro século. Nestes dias não consigo conter meus pensamentos, que voam da cordilheira ao sul longínquo, se fixam por instantes em um pueblito na pampa ou pairam sobre uma velha cidade colonial no noroeste extremo, quase um outro país, quase um outro amor. Quem sabe está lá, na grande capital portenha, a raiz dessa minha europeíce teimosa num país tropical sem memórias, sem apegos à história.
Faço a mim mesma a promessa solene de em breve percorrer as ruas hoje decadentes mas ainda orgulhosas, elegantes e civilizadas, visitar livrarias que não encontram rival deste lado da fronteira, e esboçar um livro durante infindáveis horas em cafés quase parisienses.

Profissão estranha
Por essa eu não esperava. Feitos todos os exames, recebidos todos os OKs, eu já me imaginava operada, livre dos 7 graus de miopia e aposentando de vez estes malditos óculos, quando o médico me perguntou:
- Qual sua profissão?
- Sou ornitóloga.
- E como é sua atividade, exatamente?
- Coleto em campo os dados sobre as aves e uso para redigir documentos ambientais.
Então ele abanou a cabeça.
- Se você insistir, posso te operar, mas por mim não operaria. Eu não opero quem depende da visão. Por exemplo, não opero piloto de avião. E não quero te operar porque você pode perder a sua qualidade de visão e isso pode complicar teu trabalho.
E foi assim que se evanesceram meus sonhos de uma bela manhã abrir os olhos e enxergar o teto! Aprendam: ornitólogos não podem se operar de miopia. Se você for míope, faça um favor a si mesmo, evite a ornito e escolha masto, herpeto ou íctio.

Dias de bonança
Depois de tantos meses de incertezas, angústias, armadilhas criadas por meu eterno pessimismo, vivo momentos de uma paz incrível, de grandes esperanças, de energia inesgotável. Espero que dure. Espero ter, finalmente, chegado lá, naquele ponto onde o futuro se faz irreversível, desde que eu acredite que de fato o é.
Agradeço a todos que me agüentaram e me empurraram nos momentos de descontrole, que espero não se repitam nem tão cedo, nem tão impiedosos.

E no próximo post...
... conto tudo sobre a minha noite de autógrafos do próximo sábado! (já aviso que não vai ser em Sampa)

Fiquem bem.

Martha Argel

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