quarta-feira, 27 de julho de 2005

Bom (?) dia.
A leitura da Folha de São Paulo de hoje está particularmente angustiante. Manchetes. editoriais, cartas, matérias. Tudo reflete pensamentos sombrios que têm me perturbado nos últimos dias, em especial uma pergunta renitente, que curiosamente parafraseia o Cony de hoje: Quem matou Jean Charles?
O editorial de Marcelo Crivella é especialmente pungente. E a chamada dói, pela crueza como desvela a verdade: "Ele só queria ir trabalhar, mas o mataram. Jean saiu do Brasil porque aqui eletricista não acha mais emprego e salário digno".
Quem, afinal, matou o brasileiro pobre, mestiço e expatriado naquela estação de metrô londrina? Com certeza não apenas um punhado de policiais em pânico, despreparados para lidar com suas armas e seu medo. Os cúmplices são uma multidão.
A política de Gérson, que prevalece entre nossos patéticos legisladores, aqueles mesmos que em público lembram a catástrofe dos "tsumânis", e que só tomam a peito suas responsabilidades se for para legislar em proveito próprio. O povo? Foda-se o povo.
A distorção moral que cria cuecas milionárias, defensores de Daslus e publicitários mentirosos, em detrimento do contribuinte que paga em dia os tributos acachapantes e do cidadão que morre pela ausência do estado.
A omissão criminosa de Renildas de Souza, mulheres apáticas que anulam-se em favor da segurança proporcionada por um marido que (desgraça escandalosamente generalizada neste país de terceira) não passa de um ser amoral e sem respeito para com ninguém, nem mesmo para com a pobre idiota iludida.
O fanatismo religioso, que permite a pessoas com QI abaixo da média (ou ganância acima dela), chegarem a cargos de poder inimaginável, através da manipulação de eleitores crédulos, inocentes, despidos de conhecimento mas plenamente dotados de fé.
A intolerância e a falta de auto-estima, que levam ao racismo, a todas as formas de preconceito, à arrogância gratuita e adolescente de pessoas que aliviam o tédio de suas vidas inúteis por meio de agressões grosseiras, contra alvos inocentes escolhidos a esmo.
A burrice ampla, geral e irrestrita, alimentada de forma diabólica pela mídia e pelos administradores do sistema educacional, eles próprios já os frutos podres de um mecanismo mantido e azeitado pelos governantes, versão atualizada dos senhores de engenho.
Chega um ponto em que a mediocridade satura. Há alguns dias me surpreendi com um articulista da Folha que teve coragem de estampar na segunda página do jornal um sentimento que eu não ousava confessar sequer a mim própria. Ele saía de férias e dizia: quero passar uns tempos longe, e tentar esquecer que o Brasil existe. Algo assim.
É isso que sinto. Em um mês viajo para fora, para outro hemisfério. A vontade que tenho é de não voltar mais. Sei bem que é ilusão supor que a boçalidade é monopólio brazuca. Mas pelo menos lá fora a gente não passa a vergonha de saber que os imbecis do dia-a-dia nasceram no mesmo país que a gente.
Meus amigos que lêem este blog não são cretinos, mas se algum estúpido caiu aqui por acaso, eu imploro: por favor, deixe de ser o problema e passe a fazer parte da solução. Os Jean Charles do mundo todo agradecem.

Fiquem bem.
Martha Argel

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